quarta-feira, 10 de junho de 2015

Procura

Um vento morno anda pelo ar, algumas folhas voam leves pela manhã, do sol resta-nos um pouco de luz a compor o dia de primavera. Algumas raízes permanecem no chão, a lembrar que somos o que fomos e mais o que há-de vir, podemos alcançar a lua, mas sabemos não ser fácil libertar o corpo para dançar com as estrelas no topo do céu. 

Entretanto, arrumamos a casa e algumas palavras, abrimos gavetas para arejar saudades e apaziguar o desejo de infinito. 

http://images.forwallpaper.com/files/thumbs/preview/26/267016__starry-night-sky_p.jpgProcuramos o poema e deixamo-lo aqui ficar. Queremos-nos irmanar com a beleza do mundo e comungar de outras palavras. 
As nossas, hoje, não chegam para sonhar madrugadas. 


Durante a primavera inteira aprendo
os trevos, a água sobrenatural, o leve e abstracto
correr do espaço - 
e penso que vou dizer algo cheio de razão,
mas quando a sombra cai da curva sôfrega
dos meus lábios, sinto que me faltam
um girassol, uma pedra, uma ave - qualquer 
coisa extraordinária.
Porque não sei como dizer-te sem milagres
que dentro de mim é o sol, o fruto,
a criança, a água, o deus, o leite, a mãe,
o amor

que te procuram.  

Helberto Helder 
(excerto do poema "Tríptico") 

segunda-feira, 1 de junho de 2015

Infância guardada


Tambéu eu, tambéu eu

http://images.artelista.com/artelista/obras/fichas/5/3/1/8665872844407418.jpgTambém eu, também eu,
joguei às escondidas, fiz baloiços,
tive bolas, berlindes, papagaios,
automóveis de corda, cavalinhos…

Depois cresci,
tornei-me do tamanho que hoje tenho;                    
os brinquedos perdi-os, os meus bibes
deixaram de servir-me.

Mas nem tudo se foi;
ficou-me, dos tempos de menino,
esta alegria ingénua
perante as coisas novas
e esta vontade de brincar.

Sebastião da Gama